ALZIRA DE PIEDADE (mãe de Querô) - uma peça da engrenagem de "Querô - uma reportagem maldita".

  • Onde joga?
        No puteiro da Violeta, Rua Xavier da Silveira, Casa de Mulher, submundo que permeia o cais do porto, em Santos.

  • Quais são as regras do jogo?
         A submissão.

  • O que faz pra ganhar?
        Coagida e condicionada a agir, ela se faz de surda e cega para todos os tipos de direitos de mulher, de trabalhadora, de cidadã. 
  • O que sente e pensa quando perde o jogo?
        Se sente marginalizada, humilhada, oprimida, menosprezada, excluída da sociedade por fazer parte de um “jogo sujo”, do cada um por si. Sem ver saída, pensa e efetiva sua morte como a única solução para os seus problemas e conflitos internos. Alzira, em resumo, não tendo mais esperança, renuncia à própria vida.

Trechos significativos de sua vida:

Alzira engravida e decide ter a criança, mas a cafetina Violeta, não aceita e diz:

- “Criança em casa de mulher não presta”.
(Alzira)  - Eu vou pra onde? Eu quero criar o nenê. É meu filho. Eu quero ele.
(Violeta) - Eu que vou saber? Quero que se dane! Não mandei ninguém parir. Agora se vire. Aqui que não pode ficar. E fim de papo.

Alzira é jogada na rua sem nenhuma compaixão, por representar para a cafetina um obstáculo na obtenção do lucro, mediante ao conflito e sem saída, deixa a criança na porta do puteiro e vai em busca do fim.    

- “Meteu cachaça na caveira até transbordar pelas orelhas, ou até acabar a grana”.
“... quando estava bem chapada de pinga, bebeu querosene”. Foi pras picas.

Caída na porta da igreja, gemia, chorava, vomitava, cagava, mijava, chamava por Deus, pelos santos e pelo filho. 

- "Tinha um monte de gente vendo. Mas ninguém se doía."

Morreu de forma desumana, pela omissão de socorro, por pessoas que presenciavam a cena e que não tiveram sensibilidade em chamar o resgate.

- "Ninguém chamou ambulância, nem porra nenhuma. Aqueles veados miseráveis eram todos surdos pra dor dos outros."   
- "Não é todo dia que uma puta bebe querosene".


Considerações

A personagem Alzira vive no contexto do submundo, que na realidade, grande parte da sociedade prefere ignorar.
 Prostituta, vive do trabalho informal, atua de forma silenciada, conformada com a exploração sexual, violência, humilhação, corrupção, droga, tráfico e crime.
Compõe um dos comportamentos impróprios, em relação ao que a sociedade em geral considera "normais". É excluída porque faz parte de uma cultura marcada pela desigualdade, que marginaliza e é preconceituosa. 
Seus direitos de cidadã são limitados. Vive em condições precárias e desumanas.
Alzira faz parte de um cenário onde predomina o mais forte e a lei da sobrevivência, onde usam a violência como forma de comunicação, falam a mesma linguagem usando gírias e palavrões, partilham dos mesmos objetivos e encenam a mesma história.

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